Inciativa da Fundação American Board of Internal Medicine visa ampliar a cultura da sabedoria na saúde
A Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial anuncia a adesão à campanha Choosing Wisely Brasil. A iniciativa foi criada pela American Board of Internal Medicine (ABIM), em 2011, e chegou ao país em 2015. O objetivo é ampliar a percepção dos profissionais da saúde para a importância do uso adequado, consciente e sem excessos de recursos da área e vai ao encontro do conceito Less is more ou “menos é mais”. Para isso, o projeto engaja diversas sociedades médicas para que apontem, através de uma lista de recomendações, condutas que não devem ser indiscriminadamente adotadas, fazendo com que os especialistas reflitam sobre os procedimentos de sua atividade.
“Essa é mais uma iniciativa para reforçar o uso consciente dos exames laboratoriais para fins de prevenção, diagnóstico e monitoramento das patologias. Nosso objetivo é fazer com que os especialistas auxiliem na busca pelo equilíbrio entre a gestão de recursos da saúde e a excelência no atendimento ao paciente”, afirma o presidente da SBPC/ML, Wilson Shcolnik.
De acordo com Choosing Wisely, atualmente mais de 70 sociedades médicas na Alemanha, Canadá, Inglaterra, Japão e Brasil, já publicaram mais de 400 recomendações sobre exames e tratamentos que devem ser reavaliados pelos especialistas.
Com base nas orientações do projeto Choosing Wisely Brasil, a SBPC/ML, com a colaboração de seus associados, elaborou uma Lista de Recomendações Top Five (abaixo) para orientar os especialistas dessa e de outras áreas em relação ao uso de exames laboratoriais. Para acessar a lista completa, clique aqui.
Segundo a Sociedade, em breve serão divulgadas recomendações sobre outros exames laboratoriais.
Lista de Recomendações Top Five
1) Não realize triagem para a deficiência de 25-OH-Vitamina D na população geral.
A deficiência de vitamina D é comum em diversas populações, particularmente durante os meses de inverno, com exposição solar limitada. A suplementação de vitamina D e a exposição solar são suficientes para a correção da hipovitaminose D na maioria dos indivíduos saudáveis.
O exame é indicado aos pacientes com maior risco para deficiência de vitamina D. Por exemplo, idosos, gestantes, lactantes, pacientes com raquitismo/osteomalacia, osteoporose, pacientes com história de quedas e fraturas, causas secundárias de osteoporose (doenças e medicações), hiperparatiroidismo, doenças inflamatórias, doenças autoimunes, doença renal crônica e síndromes de má-absorção (clínicas ou pós-cirúrgicas).
Referências:
Sattar N, Welsh P, Panarelli M, Forouchi NG. Increasing requests for vitamin D measurement: Costly, confusing, and without credibility. Lancet [Internet]. 2012 Jan 14 [cited 2012 Oct 12];379:95-96.
Bilinski K, Boyages S. The rising cost of vitamin D testing in Australia: time to establish guidelines for testing. Med J Aust [Internet]. 2012 Jul 16 [cited 2012 Oct 12];197 (2):90.
Lu CM. Pathology consultation on vitamin D testing: Clinical indications for 25(OH) vitamin D measurement [Letter to the editor]. Am J Clin Pathol [Internet]. 2012 May [cited 2012 Oct 12];137:831.
Holick M, Binkely N, Bischoll-Ferrari H, Gordon CM, Hanley DA, Heaney RP, Murad MH, Weaver CM; Endocrine Society. Evaluation, treatment, and prevention of vitamin D deficiency: An Endocrine Society Clinical Practice Guideline. J Clin Endocrinol Metab [Internet]. 2011 Jul [cited 2012 Oct 12];96(7):1911-1930.
2) Não realize exames moleculares para pesquisa de HPV de baixo risco tumoral.
Não há indicação clínica para a pesquisa de HPV de baixo risco (subtipos de HPV que induzem a formação das verrugas genitais ou alterações celulares de baixo risco no colo do útero), pois a infecção por estes subtipos de HPV não está associada à progressão de doença tumoral e não existe uma terapia específica para esta condição de HPV.
As diretrizes indicam a utilização da pesquisa molecular do HPV em pacientes com resultado da colpocitologia oncótica (Papanicolaou) alterado ou em outras indicações clínicas específicas. A presença de subtipos de HPV de alto risco exige uma investigação minuciosa (por exemplo, colposcopia e biópsia).
Referências:
Lee JW, Berkowitz Z, Saraiya M. Low-risk human papillomavirus testing and other non recommended human papillomavirus testing practices among U.S. health care providers. Obstet Gynecol. 2011 Jul;118(1):4-13.
Saslow D, Solomon D, Lawson HW, Killackey M, Kulasingam SL, Cain J, Garcia FA, Moriarty AT, Waxman AG, Wilbur DC, Wentzensen N, Downs LS Jr, Spitzer M, Moscicki AB, Franco EL, Stoler MH, Schiffman M, Castle PE, Myers ER; ACS-ASCCP-ASCP Cervical Cancer Guideline Committee. American Cancer Society, American Society for Colposcopy and Cervical Pathology, and American Society for Clinical Pathology Screening Guidelines for the Prevention and early Detection of Cervical Cancer. Am J Clin Pathol [Internet]. 2012 May-Jun [cited 2012 Oct 12];137:516-542.
Zhao C, Chen X, Onisko A, Kanbour A, Austin RM. Follow-up outcomes for a large cohort of U.S. women with negative imaged liquid-based cytology findings and positive high risk human papillomavirus test results. Gynecol Oncol [Internet]. 2011 Aug [cited 2012 Oct 12];122:291–296.
American Society for Colposcopy and Cervical Pathology. Descriptions of new FDA-approved HPV DNA tests. HPV Genotyping Clinical Update.[Internet]. Frederick (MD): American Society for Colposcopy and Cervical Pathology. 2009. [Cited 2012 Oct 12]. Available from: www.asccp.org/ConsensusGuidelines/HPVGenotypingClinicalUpdate/tabid/5963/Default.aspx.
3) Não realize exame de VHS (velocidade de hemossedimentação) para caracterização de um processo inflamatório em pacientes ainda sem um diagnóstico definido. Solicite uma proteína C-reativa (PCR) para detecção de inflamação aguda.
A PCR apresenta maior sensibilidade e reflete especificamente a fase aguda da inflamação quando comparada ao VHS. A PCR irá se elevar nas primeiras 24 horas da evolução da doença, enquanto a VHS poderá estar normal. Se o fator causal do processo inflamatório for debelado, a PCR retornará ao normal dentro de um dia, enquanto a VHS permanecerá elevada por vários dias até que o excesso de fibrinogênio seja removido do soro.
Referências:
Crowson CS, Rahman MU, Matteson EL. Which measure of inflammation to use? A comparison of erythrocyte sedimentation rate and C-reactive protein measurements from randomized clinical trials of golimumab in rheumatoid arthritis. J Rheumatol. 2009 Aug;36 (8):1606-10.
Wu AH, Lewandrowski K, Gronowski AM, Grenache DG, Sokoll LJ, Magnani B. Antiquated tests within the clinical pathology laboratory. Am J Manag Care. 2010 Sep;16(9):e220-7. Black S, Kushner I, Samols D. C-reactive protein. J Biol Chem. 2004 Nov 19:279(47):48487-90.
Henriquez-Camacho C, Losa J. Biomarkers for sepsis. Biomed Res Int. 2014;2014:547818.
Lelubre C, Anselin S, Zouaoui Boudjeltia K, Biston P, Piagnerelli M. Interpretation of C-reactive protein concentrations in critically ill patients. Biomed Res Int. 2013;2013:124021.
4) Não utilize o exame para dosagem de mioglobina ou CK-MB no diagnóstico de infarto agudo do miocárdio (IAM). Ao invés disso, use troponina I ou T.
Ao contrário da CK-MB e da mioglobina, a elevação da troponina I ou T é específica para a lesão cardíaca. Após a necrose do musculo cardíaco, a troponina é liberada na circulação antes da CK-MB e até antes que a mioglobina. Aproximadamente 30% dos pacientes com queixa de desconforto torácico em repouso e CK-MB normal serão diagnosticados com IAM, quando avaliados pela dosagem das troponinas. Uma única dosagem de troponina pode estimar a área cardíaca acometida e o nível de gravidade do IAM. A extensa literatura fornece embasamento científico para uso exclusivo da troponina como teste laboratorial no diagnóstico do IAM, em detrimento do CK-MB e outros marcadores.
Referências:
Thygesen K, Alpert JS, White HD; Joint ESC/ACCF/AHA/WHF Task Force for the Redefinition of Myocardial Infarction, Jaffe AS, Apple FS, Galvani M, Katus HA, Newby LK, Ravkilde J, Chaitman B, Clemmensen PM, Dellborg M, Hod H, Porela P, Underwood R, Bax JJ, Beller GA, Bonow R, Van der Wall EE, Bassand JP, Wijns W, Ferguson TB, Steg PG, Uretsky BF, Williams DO, Armstrong PW, Antman EM, Fox KA, Hamm CW, Ohman EM, Simoons ML, Poole-Wilson PA, Gurfinkel EP, Lopez-Sendon JL, Pais P, Mendis S, Zhu JR, Wallentin LC, Fernández-Avilés F, Fox KM, Parkhomenko AN, Priori SG, Tendera M, Voipio-Pulkki LM, Vahanian A, Camm AJ, De Caterina R, Dean V, Dickstein K, Filippatos G, Funck-Brentano C, Hellemans I, Kristensen SD, McGregor K, Sechtem U, Silber S, Tendera M, Widimsky P, Zamorano JL, Morais J, Brener S, Harrington R, Morrow D, Lim M, Martinez-Rios MA, Steinhubl S, Levine GN, Gibler WB, Goff D, Tubaro M, Dudek D, Al-Attar N. Universal definition of myocardial infarction. Circulation. 2007 Nov 27;116(22):2634-53.
Eggers KM, Oldgren J, Nordenskjöld A, Lindahl B. Diagnostic value of serial measurement of cardiac markers in patients with chest pain: limited value of adding myoglobin to troponin I for exclusion of myocardial infarction. Am Heart J. 2004 Oct;148(4):574-81.
Macrae AR, Kavsak PA, Lustig V, Bhargava R, Vandersluis R, Palomaki GE, Yerna MJ, Jaffe AS. Assessing the requirement for the 6-hour interval between specimens in the American Heart Association Classification of Myocardial Infarction in Epidemiology and Clinical Research Studies. Clin Chem. 2006 May;52(5):812-8.
Kavsak PA, Macrae AR, Newman AM, Lustig V, Palomaki GE, Ko DT, Tu JV, Jaffe AS. Effects of contemporary troponin assay sensitivity on the utility of the early markers myoglobin and CKMB isoforms in evaluating patients with possible acute myocardial infarction. Clin Chem Acta. 2007 May 1;380(1-2):213-6.
Reichlin T. Hochholzer W, Bassetti S, Steuer S, Stelzig C, Hartwiger S, Biedert S, Schaub N, Buerge C, Potocki M, Noveanu M, Breidthardt T, Twerenbold R, Winkler K, Bingisser R, Mueller C. Early diagnosis of myocardial infarction with sensitive cardiac troponin assays. N Engl J Med. 2009 Aug 27;361(9):858-67.
5) Não realize exame genético da APOE como um teste preditivo para a doença de Alzheimer.
APOE é um gene relacionado à suscetibilidade para a doença de Alzheimer (DA) de início tardio, sendo esta patologia a causa mais comum da demência. A presença isolada de um alelo ε4 não é necessária nem suficiente para o desenvolvimento da DA. O risco relativo conferido pelo alelo ε4 pode ser confundido na presença de outros alelos de risco, sexo, ambiente e, possivelmente, etnia. A genotipagem da APOE para predição de risco de DA tem utilidade clínica limitada e baixo valor preditivo.