Técnica não invasiva pode ajudar na detecção precoce da doença
A análise de DNA livre de células (cfDNA) em amostras de urina mostra ser uma técnica promissora na detecção precoce de câncer de pâncreas, principalmente em crianças, nas quais certos tumores evoluem mais rápido que em adultos.
A conclusão é de um estudo do Translational Genomics Research Institute (TGen), organização sem fins lucrativos com sede no estado norte-americano do Arizona. A pesquisa também contou com a participação de equipes da Baylor University e do Phoenix Children’s Hospital.
“Até agora, pensava-se que os fragmentos de DNA na urina eram degradados aleatoriamente e curtos demais para fornecer qualquer informação significativa sobre uma doença tão complexa como o câncer”, explica Muhammed Murtaza, PhD, professor associado e codiretor do Center for Noninvasive Diagnostics do TGen e autor sênior do estudo.
Segundo ele, a pesquisa mostra que os fragmentos de DNA na urina não são aleatórios e podem indicar claramente uma diferença entre indivíduos saudáveis e os que apresentam a doença.
Ao analisar amostras de tecidos de crianças com vários tipos de tumor e de adultos com câncer de pâncreas, cuja detecção precoce é crítica para o tratamento, os pesquisadores conseguiram mapear os perfis de fragmentação do DNA na urina.
De acordo com Murtaza, a pesquisa permitiu descobrir que certas regiões do genoma são protegidas da fragmentação na urina em indivíduos saudáveis, porém são mais fragmentadas naqueles com câncer.
Além disso, os perfis dessa fragmentação apresentaram grande semelhança nos pacientes analisados, inclusive no comprimento dos fragmentos do DNA e na região do genoma onde ocorria a fragmentação. Essa informação permitiu verificar quais tipos de células contribuem com os fragmentos.
No estudo foi usado o sequenciamento do genoma completo de 30 amostras de urina e 15 de plasma de pacientes saudáveis para determinar a distribuição do tamanho do fragmento de cfDNA. Também foram analisadas amostras de urina de oito pacientes saudáveis e 22 com câncer em estágios I a IV, sendo dez crianças e 12 adultos com tumor no pâncreas.
Murtaza reconhece que, embora os resultados iniciais sejam promissores, é preciso testar essas descobertas em populações muito maiores de pacientes com câncer e identificar possíveis diferenças entre homens e mulheres, jovens e idosos e naqueles que apresentam comorbidades, como diabetes e outras doenças crônicas.
“Os resultados desse estudo são fundamentais e fornecem um caminho potencialmente dinâmico para o diagnóstico precoce do câncer, uma vez que a urina é uma das amostras mais fáceis de coletar. Se os estudos subsequentes derem resultados positivos, espero um dia poder ver esse teste tornar-se parte integrante da rotina de exames anuais de uma pessoa”, destaca o médico Daniel Von Hoff, professor do TGen e coautor do trabalho.
Estudos com uso de fragmentos genéticos não são novidade para Muhammed Murtaza. Ele liderou pesquisas anteriores no TGen que utilizaram DNA circulante no sangue a partir de uma simples coleta.
Segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca), o câncer de pâncreas mais comum no Brasil é o adenocarcinoma, que corresponde a 90% dos casos diagnosticados no país. Por ser uma doença difícil de detectar precocemente, sua taxa de mortalidade é alta devido ao diagnóstico tardio. No Brasil, é responsável por aproximadamente 2% de todos os tipos de câncer diagnosticados e 4% do total de mortes pela doença.
O artigo Analysis of recurrently genomic regions in cell-free DNA found in urine foi publicado online em 17 de fevereiro deste ano no periódico Science Translational Medicine.